Um dia a pé
Thiago é um motorista compulsivo. E, admite, não muito gentil. Por
um dia, ele sentiu os medos e as vantagens de ser pedestre. E voltou
diferente ao volante.
Thiago largou o carro na garagem e experimentou os prós e contras de outros tipos de transporte.
Comprar um carro é o sonho de muita gente. Faz sentido: em muitos
casos, ele continua sendo a maneira mais rápida e confortável de ir e
vir. Mas, conforme cresce o número de automóveis nas ruas, tendem a
aumentar também os problemas associados a eles. De acordo com pesquisa
da Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente do Rio de Janeiro,
os veículos são responsáveis por 77% da poluição nas grandes cidades. E
os acidentes de trânsito matam 95 pessoas por dia no país, diz o
Ministério da Saúde.
Boa parte dessas mortes resulta de um curioso fenômeno psicológico:
muita gente, quando entra no carro, passa a se sentir superior, o que
pode transformar o automóvel numa arma. “O trânsito reproduz valores de
uma sociedade que ainda está atrelada a um passado em que alguns podiam
mais do que muitos”, analisa o antropólogo Roberto DaMatta. Ou seja: na
cabeça de muito motorista, só de ter um carro, ele já é melhor que os
outros – logo, tem o direito de passar por cima.
O publicitário Thiago Yamabuchi, de 24 anos, conhece esse
comportamento na prática. Motorista desde os 18 anos, ele usa o carro
até para percorrer os cinco quarteirões entre sua casa e o parque onde
costuma correr, em São Caetano do Sul (SP). “No trânsito, todo mundo
quer dar uma de espertalhão. Eu mesmo não costumo ser gentil”, admite.
Essa postura é muito prejudicial a quem costuma dividir as ruas com
os veículos: os pedestres e ciclistas. Para sentir isso na pele,
convidamos Thiago a viver esse outro lado do trânsito. Veja como foi a
experiência!
1. Transporte coletivo, eu?
Quando fizemos a proposta, Thiago fez cara feia. “Não sei apertar o ‘T’, de térreo, no elevador do meu prédio. Já vou automaticamente no ‘G’, de garagem. Mesmo para as distâncias curtas, sempre uso o carro. Para ir ao trabalho, então, que fica a 25 quilômetros de casa, nem cogito outra opção. Ainda mais porque de manhã sempre estou de mau humor. Não gosto de encontrar ninguém. Entro no carro, ligo o som, fecho os vidros e me sinto numa bolha. De transporte público, tenho de pensar, logo cedo, que linha pegar, onde é o ponto, onde fica a escada rolante... Não gosto.” Mas ele nem tinha experimentado ainda...
Quando fizemos a proposta, Thiago fez cara feia. “Não sei apertar o ‘T’, de térreo, no elevador do meu prédio. Já vou automaticamente no ‘G’, de garagem. Mesmo para as distâncias curtas, sempre uso o carro. Para ir ao trabalho, então, que fica a 25 quilômetros de casa, nem cogito outra opção. Ainda mais porque de manhã sempre estou de mau humor. Não gosto de encontrar ninguém. Entro no carro, ligo o som, fecho os vidros e me sinto numa bolha. De transporte público, tenho de pensar, logo cedo, que linha pegar, onde é o ponto, onde fica a escada rolante... Não gosto.” Mas ele nem tinha experimentado ainda...
2. Mais rápido, mais barato
“Caminhei, peguei trem, metrô e ônibus. E, por incrível que pareça, cheguei ao trabalho mais rápido do que de carro. Poderia ter dormido meia hora a mais. Também foi mais barato: gasto, em média, cerca de 15 reais por dia com gasolina. De transporte público, calculando ida e volta, foram dois terços disso.” E dá pra ouvir música igual...
“Caminhei, peguei trem, metrô e ônibus. E, por incrível que pareça, cheguei ao trabalho mais rápido do que de carro. Poderia ter dormido meia hora a mais. Também foi mais barato: gasto, em média, cerca de 15 reais por dia com gasolina. De transporte público, calculando ida e volta, foram dois terços disso.” E dá pra ouvir música igual...
3. Faixa de quem?
“De carro, nunca paro na faixa de pedestres se não tiver semáforo. Essa gentileza, aliás, me incomoda muito quando dirijo na praia, onde se costuma parar e o trânsito congestiona. Como não temos esse hábito na cidade, não me surpreendi quando não me deram preferência. Para cruzar, tive de esperar no meio da via, entre os carros.”
“De carro, nunca paro na faixa de pedestres se não tiver semáforo. Essa gentileza, aliás, me incomoda muito quando dirijo na praia, onde se costuma parar e o trânsito congestiona. Como não temos esse hábito na cidade, não me surpreendi quando não me deram preferência. Para cruzar, tive de esperar no meio da via, entre os carros.”
4. Haja braço sobre rodas
“O pessoal da reportagem descolou uma cadeira de rodas para eu sentir como é a situação de um deficiente físico. É preciso muita força para se locomover pelas calçadas irregulares. E a faixa de pedestre não serve para nada se o meio-fio não for rebaixado. Mas, mesmo quando há rampas, elas são tão malfeitas que só com muita força se consegue subi-las. Haja braço – e coragem.”
“O pessoal da reportagem descolou uma cadeira de rodas para eu sentir como é a situação de um deficiente físico. É preciso muita força para se locomover pelas calçadas irregulares. E a faixa de pedestre não serve para nada se o meio-fio não for rebaixado. Mas, mesmo quando há rampas, elas são tão malfeitas que só com muita força se consegue subi-las. Haja braço – e coragem.”
5. Uma “fina” educativa
“Nunca enxerguei o ciclista como um carro a menos na rua. Para mim, era um cara devagar na minha frente – e que ainda por cima não paga IPVA. De bike, fui xingado, buzinado e fechado. Eu me senti um intruso, numa disputa desleal por espaço. E tive medo ao perceber quanto estava vulnerável. Um ônibus passou a poucos centímetros de mim. Mais um pouco, ele me derrubava.”
“Nunca enxerguei o ciclista como um carro a menos na rua. Para mim, era um cara devagar na minha frente – e que ainda por cima não paga IPVA. De bike, fui xingado, buzinado e fechado. Eu me senti um intruso, numa disputa desleal por espaço. E tive medo ao perceber quanto estava vulnerável. Um ônibus passou a poucos centímetros de mim. Mais um pouco, ele me derrubava.”
Pequenas mudanças
A experiência mostrou a Thiago que se fechar dentro do carro não é a única maneira de enfrentar seu mau humor matinal. Numa parada antes de pegar o ônibus, ele fez uma pausa para tomar um suco, o que lhe rendeu o sorriso da foto acima. Outra surpresa foi uma loja bacana na mesma quadra da sua casa, que ele só percebeu quando passou a pé por ali. Quando voltou à sua rotina de motorista, a reportagem o acompanhou. Naquele dia, um apagão desligou vários semáforos, em plena hora do rush. Os motoristas urravam ameaças a quem tentasse levar vantagem. Thiago se manteve calmo. Até deu passagem para facilitar o fluxo. Já parecia um pouco transformado, após passar um dia na pele dos outros.
A experiência mostrou a Thiago que se fechar dentro do carro não é a única maneira de enfrentar seu mau humor matinal. Numa parada antes de pegar o ônibus, ele fez uma pausa para tomar um suco, o que lhe rendeu o sorriso da foto acima. Outra surpresa foi uma loja bacana na mesma quadra da sua casa, que ele só percebeu quando passou a pé por ali. Quando voltou à sua rotina de motorista, a reportagem o acompanhou. Naquele dia, um apagão desligou vários semáforos, em plena hora do rush. Os motoristas urravam ameaças a quem tentasse levar vantagem. Thiago se manteve calmo. Até deu passagem para facilitar o fluxo. Já parecia um pouco transformado, após passar um dia na pele dos outros.
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