terça-feira, 1 de setembro de 2015

LIÇÕES INESQUECÍVEIS DE BEZERRA DE MENEZES — O SERVO DO SENHOR. Por Maryneves Saraiva de Arêa Leão Costa


Ismael reúne seus dedicados companheiros no espaço e adverte sobre o século do consolador, o aumento da dor, as transições, período de grande amargura para a purificação espiritual; Ismael dirige-se a um fiel discípulo e fala-lhes ao coração: “Descerás as lutas terrestres com o objetivo de concentrar as nossas energias no país do cruzeiro [...] arregimentarás todos os elementos dispersos [...] com o fim de criar o nosso núcleo de atividades espirituais [...] a luta vai ser grande, o discípulo escolhido não pudera responder [...] Daí a algum tempo, no dia 29 de agosto de 1831, em Riacho do Sangue, no estado do Ceará”. (XAVIER, Francisco Cândido, Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho. Por Humberto de Campos, Cap. 22)

Este artigo pretende ressaltar as lições de Bezerra de Menezes, assim como versar sobre sua vida, englobando desde sua participação política até seu engajamento na vida Espírita. Tem como objetivo, portanto, dar ênfase aos seus escritos e ensinamentos.
Diversas obras e estudos dão foco à capacidade e firmeza de Bezerra de Menezes no cenário político de transição do Império à República, nos apresentam igualmente a sua participação no movimento Espírita, revelando-nos o seu empenho para dar aplicabilidade à máxima de Cristo “Amai-vos uns aos outros”. Dentre tais obras, destacam-se: Vida e Obra de Bezerra de Menezes, de Sílvio Brito Soares; Grandes Espíritas do Brasil, de Zeus Wantuil; Brasil Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, de Irmão X/ Chico Xavier; Intelectuais espíritas e abolição da escravidão: os projetos de reforma na imprensa espírita (1867-1888), de Daniel Simões do Valle, e Bezerra de Menezes Ontem e Hoje, coordenado por Juvanir Borges de Souza, Edição FEB.
Esses autores ressaltam Bezerra de Menezes como um discípulo de Allan Kardec sempre na exortação do lema do codificador: “Trabalho, Solidariedade e Tolerância”.
Bezerra de Menezes buscou em sua ação missionária unir as ideias divergentes evitando separações, ressentimentos, animosidades, antipatias e desuniões. As suas mensagens, amorosas e reflexivas, destacaram não só em sua época, mas também, nos dias de hoje, o quão é imperiosa a transformação do indivíduo, espírito imortal reencarnado para evoluir. Empenhou-se na força propulsora da vivência do Espiritismo, sendo, portanto, capaz de gerar a melhoria da sociedade e contribuir para o enfrentamento do materialismo, uma vez que divulgou o ideal espírita e o aprimoramento espiritual do homem, da sociedade e da nossa humanidade.


1. APONTAMENTOS BIOGRÁFICOS DE BEZERRA DE MENEZES
1.1. De Onde veio Bezerra de Menezes?
Foi do Brasil, Coração do Mundo, que veio a informação do Espírito vinculado a Jesus e a Ismael para que um de seus discípulos reencarnasse e se dedicasse à luta para a criação das atividades espíritas no país. Informação esta que se confirma no trecho abaixo:
Ismael reúne seus dedicados companheiros no espaço e adverte sobre o século do consolador, o aumento da dor, as transições, período de grande amargura para a purificação espiritual; Ismael dirige-se a um fiel discípulo e fala-lhes ao coração: “Descerás as lutas terrestres com o objetivo de concentrar as nossas energias no país do cruzeiro [...] arregimentarás todos os elementos dispersos [...] com o fim de criar o nosso núcleo de atividades espirituais [...] a luta vai ser grande, o discípulo escolhido não pudera responder [...] Daí a algum tempo, no dia 29 de agosto de 1831, em Riacho do Sangue, no estado do Ceará”.[2]

Exatamente na data citada acima, 29 de agosto de 1831, na fazenda Santa Barbara, Riacho das pedras, município de Riacho do sangue no Ceará. Nasceu Adolfo Bezerra de Menezes Cavalcanti, filho de Antônio Bezerra de Menezes e Fabiana de Jesus Maria Bezerra. Despertou de forma muito rápida para a necessidade dos estudos. Entrou para a escola pública da Vila do Frade em 1838 e, em 1856, já havia conseguido uma de suas metas: formar-se para o bom desempenho da medicina pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Foi daí que surgiu o “Apostolo da Medicina”, o “Médico dos Pobres”, o “Amigo dos Humildes”, “Semeador de Harmonia e Paz”.
Consorciou-se com Dª Maria Cândida de Lacerda no dia 6 de novembro de 1858, que faleceu em 24 de março de 1863, deixando-lhe dois filhos. Em 1865 casa-se em segundas núpcias com a irmã de sua primeira esposa, Dª Cândida Augusta de Lacerda Machado, com quem teve sete filhos.
No contexto político nacional, de 1840 a 1889, ressalta-se a atuação de dois partidos: o conservador e o liberal.  Bezerra participou dessa trajetória política filiando-se ao Partido Liberal. Neste partido ocupou cargos, como: Vereador, Presidente da Câmara Municipal da Corte e Deputado Geral.
Os dois partidos, conservador e liberal, defendiam tanto a monarquia quanto a escravidão. Em contrapartida, Bezerra adotou, por consciência, a postura abolicionista, a qual correspondia ao pensamento da época, inclusive era partilhada pela Federação Espírita Brasileira, fundada em 1884. Acerca da contribuição sobre “deslegitimação da escravidão”, Daniel Do Valle assevera que houve de fato uma aproximação entre as Instituições Espíritas e demais grupos engajados pela luta do fim do cativeiro” (VALLE, Daniel Simões. Intelectuais Espíritas e abolição da escravidão: os projetos de reforma da impressa espírita 1867-1888 p. 165). 

É no ano de 1865 que Bezerra de Menezes encerra as suas atividades políticas e, a partir daí, dedicou-se às causas sociais, de solidariedade humana numa perspectiva de ação pessoal, que tão bem define o seu ser. O marco de sua adesão pública ao Espiritismo deu-se precisamente em 16 de agosto de 1886. Podemos afirmar que Bezerra com devoção foi concretizando em sua missão as lições de vida experimentadas por ele. Lições que transbordam de ensinamentos amorosos, nos alimentam e nos dão estímulo para escrever e rememorar sobre elas.

1.2. As bases da sua religiosidade

Dos registros de Bezerra de Menezes publicados, a Federação Espírita Brasileira em comemoração aos 100 anos de sua desencarnação, a Casa de Ismael, levou a público a seleção dos seus escritos em vida, além de publicações de encarnados e desencarnados, nas quais ele destaca a evolução do seu pensamento religioso. Eis o que afirma Bezerra:
“Nasci e criei-me, até os 18 anos no seio de uma família tradicionalmente católica... ao demais eu considerava sagrado tudo que os meus pais me ensinavam a crer e a praticar: a religião Católica Apostólica Romana. Casei-me com uma moça católica, a quem amava de coração e sempre respeitei suas crenças. ”[3]

Após a morte de sua primeira esposa, ele registra os abalos causados em sua alma pela referida perda:
“No fim de quatro anos, fui subitamente batido pelo tufão da maior adversidade que me podia sobrevir, minha mulher me foi roubada pela morte em vinte horas, deixando-me dois filhinhos um de 3 anos e outro de um. ”[4]

Outro fato marcante da vida de Bezerra, nesse intervalo de tempo, foi quando ele teve contato com um exemplar da Bíblia apresentado por um amigo, como podemos averiguar no trecho a seguir:
“Um dia, meu companheiro de consultório trouxe da rua um exemplar da bíblia, do padre Pereira de Figueiredo, entressachado de estampas finíssimas. Tomei o livro, não para ler, que já não tentava semelhante exercício; mas para ver as estampas, com verdadeira curiosidade infantil. Passei todas em revista; mas, no fim, senti desejos de ler aquele livro que encerrava minhas perdidas crenças, e que era vergonha para um homem de letras dizer que nunca lera. Comecei, pois, e esqueci-me a ler o belo livro, até perder a condução para minha casa; e depois que estive nesta, sentia prazer em pensar que voltaria a lê-lo! ” (EQUIPE FEB. Bezerra de Menezes Ontem e Hoje Pág. 13) 5
Contudo, “o meu espírito reclamava mais”, dizia Bezerra. E ele foi surpreendido por uma colega com a obra traduzida O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec. Ele assim registra:

“Deu-me na cidade e eu morava na Tijuca há uma hora de viagem de bonde. Embarquei com o livro e não tendo distração para longa e fastidiosa viagem disse comigo: ora, adeus! Não hei de ir para o inferno por ler isto; e, depois é ridículo confessar-me ignorante de uma filosofia, quando tenho estudado todas as escolas filosóficas... parece que eu era Espírita inconsciente, ou, como se diz vulgarmente, de nascença, e que todas essas vacilações que sentia meu espírito eram marchas e contramarchas que ele fazia, por descobrir o que lhe era conhecido e, por ventura, obrigado a isto. ”    (EQUIPE FEB. Bezerra de Menezes Ontem e Hoje Pág. 14 e 15)


1.3. Bezerra de Menezes e a Fundação da Federação Espírita Brasileira

A presença Portuguesa se fez também nos primórdios da divulgação Espírita no Brasil. Registra-se que, na época, Augusto Elias da Silva, fundador do jornal Reformador, se propõe a criar um centro com os cooperadores do jornal cuja finalidade consistia em congregar os grupos espíritas existentes. Assim surgiu, no dia primeiro de janeiro de 1884, a Federação Espírita Brasileira (FEB) tendo como primeiro Presidente Marechal Francisco Raimundo Ewerton Quadros, maranhense, engenheiro, militar, médium e escritor. Diga-se, uma inteligência a serviço do Espiritismo. É em 1888 que se registra sob sua gestão a sede própria da Federação Espírita Brasileira, situada no sobrado do Prédio 17 da Rua Clube Ginásio português, depois conhecida como Rua Silva Jardim. Sua Administração segue de 1884 a 1888.

Após o afastamento de Marechal Ewerton Quadros da presidência, Bezerra de Menezes é eleito ao cargo de Presidente da FEB em 1889, passando a vice-presidente em 1890 e 1891, culminando em 03 de agosto de 1895 em reunião de assembleia geral o seu mandato como o quinto presidente da FEB. Após 1890, com a promulgação do Código Penal da República, período tumultuado para a divulgação Espírita, Bezerra de Menezes permaneceu firme escrevendo sua coluna em O País. “Em 1890, em substituição ao Dr. Bezerra de Menezes, foi então o Dr. Francisco de Menezes Diaz da Cruz, que anteriormente ocupara a vice-presidência, eleito presidente da Federação Espírita Brasileira, cargo que exerceu com devotamento até os primeiros dias de 1895, quando foi substituído temporariamente, por Júlio César Leal e, definitivamente pelo Dr. Adolfo Bezerra de Menezes, o Kardec brasileiro”. 6 

6 Grandes Espíritas do Brasil, Zêus Wantuil, FEB pag. 291
A partir daí ele se tornou um incansável em torno da união e da unificação. Percebemos isso nas suas próprias palavras ao afirmar que “A casa dividida rui, todavia, ninguém pode arrebentar um feixe de varas que se agregam numa união de forças”.
Bezerra construiu a sua percepção acerca da dor de forma tão profunda e solidária que a partir daí os seus gestos, preces, palavras, abraços e doações foram gerando um marco até chegar a ser legitimado na memória coletiva do Movimento Espírita (e fora dele) como "Médico dos pobres”. Para ele, “um médico não tem o direito de terminar uma refeição, nem de escolher hora, nem de perguntar se é longe ou perto, quando um aflito qualquer lhe bate à porta”.
Feitas tais considerações acerca da vida de Bezerra de Menezes, concluímos este artigo com as palavras direcionadas a Bezerra, relacionadas ao Evangelho de Cristo nas Terras do Brasil:
 “O Brasil está cheio de ideologias novas refletindo a paisagem do século, cabe aos bons operários do evangelho concentrar suas atividades no esclarecimento das almas e na educação dos espíritos”.
E ainda as suas constantes recomendações “Mantenhamos o propósito de irmanar, aproximar, confraternizar e compreender... amor de Jesus sobre todos, verdade de Kardec para todos”.  Das lições inesquecíveis: O carinho afetuoso, o espírito de servir incondicionalmente, o pensamento sempre transcendente nos momentos de crise, porta-voz da misericórdia, impedimentos, o serviço é o nosso campo de iluminação, “disputai a honra de amar” ”mantende a chama da fraternidade acesa “Jesus está no leme do barco terrestre”.

Gratidão para Sempre!


Bibliografia
EQUIPE FEB. Bezerra de Menezes Ontem e Hoje Pág. 14 e 15
XAVIER, Francisco Cândido, Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho. Por Humberto de Campos, Cap. 22
VALLE, Daniel Simões. Intelectuais Espíritas e abolição da escravidão: os projetos de reforma da impressa espírita 1867-1888 p. 165
O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec
Grandes Espíritas do Brasil, Zêus Wantuil, FEB



Professora de História da Universidade Federal do Piauí (UFPI) e pesquisadora em História, Memória, Mulher e Políticas Públicas.
[2]XAVIER, Francisco Cândido, Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho. Por Humberto de Campos, Cap. 22
[3]EQUIPE FEB. Bezerra de Menezes Ontem e Hoje- pag. 11 e 12  
[4]EQUIPE FEB. Bezerra de Meneses Ontem e Hoje- pag. 12 e 13

Nenhum comentário:

Postar um comentário